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Uma guerrilheira americana

Lori mostra os dentes

No dia 30 de novembro de 1995 o Santos disputava a última vaga para as semifinais do Brasileirão, na imprensa havia uma discussão sobre o Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia) e, no Peru, uma presa americana era apresentada à imprensa como uma terrorista, integrante de um grupo chamado MRTA (Movimento Revolucionário Tupac Amaru). Era a primeira vez que se ouvia falar da Lori Berenson.

O “desempenho” dela nessa primeira aparição não a favoreceu. Essa imagem acima é dessa “coletiva”. Exaltada, disse que amava o povo do Peru, e que se tivesse que ir para a prisão, que fosse. Acrescentou também que o MRTA não era um grupo terrorista. As imagens não paravam de passar na TV peruana.

Ela foi julgada duas vezes. Na primeira, os membros do júri usavam capuzes para não serem identificados pelos guerrilheiros. A americana foi condenada à prisão perpétua. No segundo julgamento, teve a pena reduzida para 20 anos. Desde 2010 ela cumpre em liberdade. Mora em Miraflores, bairro de classe média de Lima. Não pode andar muito na rua porque os vizinhos gostam de hostilizá-la.

O que ela fez para ser execrada pela elite peruana e para ser condenada a 15 anos de xadrez e mais alguns em aberto? Ela foi para o congresso peruano com uma carteira de jornalista e levou uma planta do prédio. Estava acompanhada de uma falsa fotógrafa, que, na verdade, era a mulher do segundo cara da hierarquia do MRTA. A polícia encontrou armas, uniformes de polícia e uma maquete do congresso no apartamento dela.

No último dia 2 de março o NY Times publicou uma longa reportagem sobre a Lori Berenson. A Jennifer Egan assinou a matéria, e é uma das melhores coisas que li na imprensa nos últimos tempos. A página é aberta, e está aqui.

Imagem que abre a reportagem da Jennifer Egan. Berenson com o filho, Salvador, em Lima.

PS: Hoje foi anunciado que a Jennifer Egan ganhou o National Book Award. Legal, A Visit From the Goon Squad é um ótimo romance. Merece.

Esse é um pequeno especial sobre a Lori Berenson da TV Peruana. O nome do programa já é sugestivo: Enemigos Públicos.

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Um latino leva o Nobel de literatura

Já tentou escrever algum diálogo? É muito, muito difícil escrever frases que soem como verdadeiras, que não ficam “forçadas”. Existem escritores especializados em diálogos, que têm macetes para bolar uma conversa que não fique falsa.

Nobel
Para acompanhar direito as histórias do Mario Vargas Llosa é preciso prestar toda a atenção. Às vezes diálogos que aconteceram há 40 anos se intercalam com diálogos que acontecem no momento da narração. E todos os diálogos fluem. Se escrever um diálogo já é difícil, intercalar dois (às vezes mais), em tempos narrativos distintos numa sequência sem que isso fique estranho é para poucas pessoas. O Mario Vargas Llosa tem a manha.

Quando que eu me fodi? Quando que o Peru se fodeu? é a pergunta que o narrador fica martelando em Conversación en la Catedral. Além dos diálogos intercalados, outra característica dele são esses fluxos de consciência – que também são difíceis de escrever. Ou seja, o Mario Vargas Llosa tem superávit de técnica.

Conversación en la Catedral
Conversa na Catedral é, provavelmente, o livro mais famoso dele. Li há alguns anos. Peguei a versão em Espanhol e empaquei. Não conhecia muitas das palavras e expressões. Como um parente tinha a versão em Português, acabei fazendo uma leitura “mista”. Eu ia lendo em Espanhol. Se topasse com algum parágrafo que não entendesse, lia o mesmo parágrafo da versão em Português. Depois de fazer isso algumas vezes pude seguir só no Espanhol.

A Catedral do livro não é uma igreja, é um bar. O narrador, Santiago, vai pegar o cachorro da mulher no canil. Lá ele reconhece o antigo motorista do pai. Eles saem para beber na Catedral, que dá o nome ao livro.

O pai do narrador era um homem do alto escalão do ditador peruano Odría. O filho narrador, o mais novo, o mais querido do pai, saiu de casa jovem, rompendo com a família sem explicar por quê. Ele conhece histórias secretas do pai. A ação acontece nesses dois planos (saída dele de casa, conversa dele com o antigo serviçal) e também em outros – a história de um capa preta apelidade de Buitre (Abutre) e, depois, de Cayo Mierda, um puteiro chique frequentado por gente da ditadura, na vida do serviçal que virou homem do canil numa cidade pequena. Todos esses tempos se intercalam e se misturam no livro. É muito bom.

Por uma coincidência, estou lendo um livro dele agora. La Fiesta del Chivo, que se passa na República Dominicana. Acabo de passar da metade. A história tem alguns pontos em comum com Conversación en la Catedral. Uma filha de um funcionário do alto escalão de uma ditadura que dá as costas para a família sem explicar o porquê. Um complô para matar o ditador (e eles matam). E o ditador escroto. Vários tempos diferentes, sendo o presente narrativo a volta da filha à República Dominicana depois de décadas nos EUA sem pisar no país natal. Estou gostando.

Fico muito contente com o prêmio que o Mario Vargas Llosa ganhou. Li pouca coisa dele, mas acho bastante merecido.

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Eleições no Peru

No Brasil e no Peru vão acontecer eleições no mesmo dia. No Peru são as regionais – e lá o voto é distritial, o que significa que os peruanos votam nos administradores regionais (os alcades dos distritos).

Se as eleições no Brasil são meio tabajara, no Peru as campanhas são tabajara e meia. Os partidos são conhecidos pelos seus símbolos. E na cédula aparece o símbolo, e não o número. Tem o partido do Condor, do Pão, da Enxada, do coração, da estrela (esse é o Apra, o mais tradicional) e o da Batata (como parte da campanha desse partido, vi uma batata roxa gigante sendo carregada por uma caminhonete).

As peças publicitárias devem ter como inspiração o programa do Chapolim Colorado.

Isso tudo significa que os candidatos são piores? Não, claro que não. Significa que os nossos publicitários tão mandando bem!

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